quinta-feira, 18 de junho de 2015

Voltaire, o caso Jean Calas e a Tolerância


Voltaire, o caso Jean Calas e a TolerânciaSer tolerante consiste em aceitar
outras formas de pensar e de atuar.
Quem procede assim revela autoconfiança,
sabe o caminho que deve percorrer,
sem necessidade de se impor aos outros.
Resumo
Frequentemente ouve-se falar em Voltaire, filósofo francês o qual é mencionado como defensor da “tolerância”. É comum ouvir a frase “posso não concordar com uma só palavra do que dizes, mas defenderei até a morte seu direito de dize-lo”. Esta frase exprime bem o que é a tolerância, mas será só isto?
Neste trabalho depois de apresentar alguns detalhes sobre a vida do filósofo e de contar a motivação para escrever sobre a tolerância, o caso Jean Calas apresenta-se pensamentos de Voltaire sobre Deus, ele que muitos dizem agnóstico.
Vida De Voltaire
François Marie Arouet, mais conhecido como Voltaire, nasceu na cidade de Paris, em 21 de novembro de 1694 e morreu, na mesma cidade, em 30 de maio de 1778. Foi um escritor, ensaísta, deísta e filósofo iluminista francês, conhecido pela sua perspicácia e espiritualidade na defesa das liberdades civis, inclusive liberdade religiosa e livre comércio.
É uma dentre muitas figuras do Iluminismo cujas obras e idéias influenciaram pensadores importantes tanto da Revolução Francesa quanto da Americana. Escritor prolífico, Voltaire produziu cerca de 70 obras em quase todas as formas literárias, assinando peças de teatro, poemas, romances, ensaios, obras científicas e históricas, mais de 20 mil cartas e mais de 2 mil livros e panfletos. Foi um defensor aberto da reforma social apesar das rígidas leis de censura e severas punições para quem as quebrasse. Um polemista satírico, ele frequentemente usou suas obras para criticar a Igreja Católica e as instituições francesas do seu tempo. Voltaire é o patriarca de Ferney. Ficou conhecido por dirigir duas críticas aos reis absolutistas e aos privilégios do clero e da nobreza. Por dizer o que pensava, foi preso duas vezes e, para escapar a uma nova prisão, refugiou-se na Inglaterra.
Durante os três anos em que permaneceu naquele país, conheceu e passou a admirar as idéias políticas de John Locke.
Sem ser maçon defendia os ideais maçônicos (ou será que suas idéias influenciaram a maçonaria?). Talvez por isto, já com idade avançada, foi iniciado maçom no dia 7 de março de 1778, mesmo ano de sua morte, numa das cerimônias mais brilhantes da história da maçonaria mundial, a Loja Les Neuf Soeurs, Paris, inicia ao octogenário Voltaire, que ingressa no Templo apoiado no braço de Benjamin Franklin, que era embaixador dos EUA na França nessa data. A sessão foi dirigida pelo Venerável Mestre Lalande (Joseph Jérôme Lefrançois de Lalande nasceu em 11 de julho de 1732 e faleceu em 04 de abril de 1807, foi um astrônomo francês, maçom e escritor), na presença de 250 irmãos. O venerável ancião, orgulho da Europa, foi revestido com o avental que pertenceu a Helvetius (Claude Adrien Helvétius nasceu em 26 de janeiro ou 26 de fevereiro de 1715 (fontes diferem) e faleceu em 26 de dezembro de 1771, foi um filósofo francês que foi maçom) que fora cedido, para a ocasião, pela sua viúva.
Chamado a Paris em 1778, foi recebido em triunfo pela Academia e pela Comédie-Française, onde lhe ofereceram um busto. Esgotado, morreu a 30 de maio de 1778.
Algumas vezes o nome de Voltaire é usado como exemplo de filósofo agnóstico. No livro sobre a tolerância, o capítulo XXII é uma prece à Deus, não ao Deus imposto pelo Vaticano, mas a um Deus universal o Deus de Spinoza. Assim dizia Voltaire:
“Não é mais aos homens que me dirijo. é à você, Deus de todos os seres, de todos os mundos e de todos os tempos:
Que os erros agarrados à nossa natureza não sejam motivo de nossas calamidades. Você não nos deu coração para nos odiarmos nem mãos para nos enforcarmos. Faça com que nos a ajudemos mutuamente a suportar o fardo de uma vida penosa e passageira.
Que as pequenas diferenças entre as vestimentas que cobrem nossos corpos, entre nossos costumes ridículos, entre nossas leis imperfeitas e nossas opiniões insensatas não sejam sinais de ódio e perseguição.
Que aqueles que acedem velas em pleno dia para Te celebrar, suportem os que se contentam com a luz do sol.
Que os que cobrem suas roupas com um manto branco para dizer que é preciso Te amar, não detestem os que dizem a mesma coisa sob um manto negro.
Que aqueles que dominam uma pequena parte desse mundo, e que possuem algum dinheiro, desfrutem sem orgulho do que chamam poder e riqueza e que o outros não os vejam com inveja, mesmo porque, você sabe, não há nessas vaidades nem o que invejar nem do que se orgulhar.
Que eles tenham horror à tirania exercida sobre as almas, como também exercem os que exploram a força do trabalho. Se os flagelos da guerra são inevitáveis, não nos violentemos em nome da paz.
Que possam todos os homens se lembrar que são irmãos!”
Estas idéias eram totalmente contrárias à religião católica e que fez com que tivesse muitos inimigos. Conta-se que seus inimigos gratificaram uma enfermeira chamada Sidonie Marie, que acompanhou seus últimos momentos, para contar que o filósofo morrera pedindo perdão por suas idéias. Este fato não foi comprovado. Entretanto o bispo de Troyes emitiu ordem proibindo que o corpo de Voltaire fosse sepultado em solo sagrado por tratar-se de “um ser satânico, um estúpido ateu e libertino”. Tarde demais, o corpo já havia sido sepultado o que foi comunicado pelo pároco da abadia de Scelliers, com toda pompa que o ato exigia. Hoje, estátua e tumba estão no “Panthéon”, em Paris, local onde se encontram túmulos de importantes figuras francesas.
Tolerância e o Caso Calas
Em 1763, Voltaire escreveu o “Traité sur la tolérance” motivado pelo caso Calas, comerciante de Toulouse. Foi no Castelo de Ferney que Voltaire escreveu e publicou em 1763 depois da morte de Jean Calas, injustamente acusado e executado a 10 de Março de 1762, pela morte do seu filho, que se havia convertido ao cristianismo. Nessa obra Voltaire convida à tolerância entre os religiosos, atacando diretamente o fanatismo religioso – e mais particularmente o dos jesuítas onde havia estudado quando jovem – e onde apresenta um requisitório contra as superstições ligadas aos religiosos.
Jean Calas pertencia a uma família protestante huguenote, com exceção da empregada católica e de seu filho, Marc-Antoine que queria se converter ao catolicismo. Marc-Antoine foi encontrado enforcado na loja comercial de seu pai que acabou sendo acusado de homicídio voluntário. A família foi presa, e o pai, a pedido da população e segundo ordem de oito juízes, foi condenado à pena de morte sob suplício da roda, mesmo na ausência de provas. De notar o contexto histórico durante o qual se realiza o processo então profundamente marcado pela guerra das religiões francesas dos séculos anteriores.
Depois da execução de Jean Calas, que sempre gritou a sua inocência, o processo é reaberto em Paris e a família Calais reabilitada.
Neste exemplo há intolerância de ambas as partes, católica e protestante, seja Calas inocente ou culpado. Se Calas fosse inocente, havia intolerância da igreja católica. Se fosse culpado a intolerância seria do pai huguenote.
Epílogo
Tolerância é uma qualidade que depende da moral vigente na época. Com efeito, pode-se dizer que tolerância encerra a aceitação dos diferentes, em idéias, aparência, atitudes. Há no entanto necessidade de reflexão em muitos casos.
Por exemplo: Aceitar sem pesquisar causas de um membro de uma sociedade que deixa de pagar sua cota é conivência, não tolerância. De modo análogo, aceitar e acobertar um criminoso é cumplicidade. Tanto conivência quanto cumplicidade são exageros e deformações da tolerância.
Referências
Borges, J. – Voltaire, o Irreverente (Palestra proferida na ARLS Alvorada da Sabedoria em 25/02/2015). JB News – Informativo, 1612 (26 de fevereiro de 2015), 12–16.
Voltaire: Dicionário filosófico, Virtual Books, 2002.




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